CONSTRUIR A PRÓPRIA CASA - o uso de cal branca na construção

A cal branca é utilizada em variadas áreas industriais, sendo na construção civil que ela tem uma aplicação mais vasta e conhecida. É na elaboração de algumas argamassas para reboco que esse produto é mais utilizado, principalmente mas massas de acabamento em paredes e tetos, misturada com areia fina e cimento ou, com gesso, nas massas de estuque.

Apesar do acabamento das paredes e tetos com massas finas ser normalmente feito por estucadores, os pedreiros também fazem com frequência esse trabalho, eu também apliquei muita dessa massa e, das minhas experiências nesse campo, concluí que o suporte onde vão ser aplicadas as massas de acabamento devem estar bem direitas e desempenadas, mas não demasiado lisas, para que aconteça uma melhor fixação da massa. As paredes ou os tetos nessas condições permitem que se faça o acabamento com uma fina camada de massa (5 mm ou menos ainda) e têm a vantagem do trabalho ser efectuado com grande rapidez. A cal misturada com areia fina e cimento torna a massa mais maleável e fácil de aplicar e também impede uma secagem demasiado rápida, dando tempo ao aplicador de fazer corretamente o seu trabalho. Convém no entanto notar que a massa puxa também consoante o tipo de suporte, a temperatura e a ventilação do local, etc.

Normalmente utilizava nessas massas seis partes de areia fina para uma de cimento e também uma de cal, mas poderia, dependendo do tipo de trabalho, usar outras proporções, não esquecendo que a cal em excesso pode provocar fissuras no revestimento, o que também pode acontecer quando é aplicada uma camada grossa de massa para endireitar paredes, o que nos remete para a necessidade dos rebocos estarem bem feitos.    

A cal também é utilizada na pintura de paredes, muros e tetos, embora neste caso o seu uso tenha vindo a decrescer de alguns anos para cá, sendo substituída pelas tintas plásticas. Creio que isso é motivado em grande parte pela descida dos preços de algumas tintas de cor branca que agora se encontram proporcionalmente muito mais baratas do que, por exemplo, há três décadas atrás. Hoje é possível encontrar latas de 20 litros de tinta branca em hipermercados a preços que rondam os quinze euros e que servem para aplicação em interiores e exteriores.

Não querendo discutir a qualidade dessas tintas, o certo é que pintar uma parede e ainda mais um teto com tinta é muito diferente do que caiar, ou seja, utilizar cal nesse trabalho. Não é que o resultado com a cal seja inferior, mas é mais difícil e trabalhoso, pois a cal não permite a utilização de rolos na pintura, o serviço tem que ser efectuado com pincéis próprios para caiar, que sempre deixam cair muita cal para o chão. Em paredes e tetos que são caiados pela primeira vez, são necessárias pelo menos duas ou três demãos para que fiquem em boas condições e se forem suportes em chapisco ainda será mais, mas tudo depende também da quantidade de água empregada na preparação da cal para caiação, lembrando que não deverá ficar demasiado aguada nem demasiado espessa.

No entanto, para paredes e muros em chapisco ou crespo, a cal pode ser uma muito boa opção em termos económicos pois as paredes com esse tipo de acabamento consomem muita tinta, pois esta tem de se infiltrar em todos os pequenos orifícios duma parede chapiscada e é necessário a aplicação de várias demãos para que o trabalho não fique com pequenos pontos negros à vista.

Quando construí a minha casa as paredes exteriores e os tetos foram acabados em chapisco. Naquele tempo para os pintar com tinta seria necessária uma pequena fortuna de que eu não dispunha e como tal tive de recorrer à cal branca para efectuar esse trabalho. Bem… se caiar paredes não é muito difícil, caiar tetos chapiscados é uma tarefa bem mais complicada, sendo necessária alguma paciência para se conseguir um trabalho perfeito e usar a cal um pouco mais espessa e um bom pincel de caiar, de preferência de linho e com uma boa “ramagem” para que a cal não escorra logo para o chão.

Naquele tempo havia quem recorresse a pulverizadores, daqueles utilizados na agricultura, para lançar a cal nas paredes e até em tetos, mas eu nunca utilizei esse estratagema e acho que não dava grande resultado pois a cal tinha que ser muito diluída e, nesse caso, eram necessárias várias aplicações, e ainda com o inconveniente da cal se espalhar por toda a parte, ficando tudo numa grande borrada.

Nunca utilizei produtos para melhorar a aderência da cal, pois nunca senti que fosse necessário nas paredes exteriores em chapisco e muito menos nos tetos. Estes mantiveram-se durante vários anos bem branquinhos e as paredes também, mas quando foi necessário repintar passei a usar tinta plástica devido à facilidade de utilização, pois a tinta permite que a pintura se faça com rolo, mesmo em paredes e tetos chapiscados, o que tem a vantagem da diminuição dos salpicos de tinta, vantagem que se torna mais evidente em casas já habitadas. Essa vantagem, aliada aos preços agora mais baixos do produto e também ao facto das paredes caiadas já não consumiram tanta tinta (se não estiverem em muito mau estado, uma demão chega), foi decisiva para, neste caso, optar pela tinta não tendo até agora notado qualquer inconveniente pelo facto de pintar por cima do caiado, embora haja quem discorde deste procedimento. Na altura em que estava em voga o acabamento exterior das casas em chapisco, muitos proprietários pintavam as suas paredes, mas davam uma primeira demão com cal para não gastarem muita tinta.

Naquele tempo ainda não havia cal em pó à venda. Ela era comercializada em pedra e tinha de ser derretida ou “queimada”, trabalho que era feito em bidões de metal de 200 litros. Nas obras que se encontravam em acabamentos era comum ver vários desses bidons sarapintados de branco, onde se colocavam as pedras e se juntava água que passado pouco tempo entrava em ebulição. Era necessário estar a mexer a cal com um pau ou uma tábua para que todo o produto ficasse bem hidratado e ir acrescentando a água necessária para que o produto ficasse em liquido pastoso. Mais tarde a massa assentava e o excesso de água que, porventura, tivesse ficado no cimo poderia ser retirado ou misturado de novo de acordo com o tipo de trabalho a que essa cal era destinada.

Já há muitos anos que a cal começou a ser fornecida em pó, em estado virgem, e também já hidratada podendo dispensar as operações chamadas de queima ou extinção da cal viva. Claro que, mesmo estando em pó, mas em estado virgem ou vivo, tem obrigatoriamente de ser queimada tal como se estivesse em pedra, e de preferência deixada a repousar durante alguns dias não podendo ser misturada com areia, cimento e água e logo aplicada, sob pena de se perder o material e o trabalho dispendido.

Um belo dia andava a efetuar uns pequenos trabalhos, desses a que na gíria dos pedreiros se dá o nome de “carocas”, quando houve necessidade de comprar alguma cal para preparar massa para regularizar pequenas áreas no reboco de algumas paredes.

O patrão foi à loja e regressou com um saco de cal em pó. Até aquela altura toda a cal que eu utilizara tinha sido sempre fornecida em pedra e, quando vi aquela, não me detive sequer a ler possíveis instruções que viriam na embalagem, pensando que já vinha pronta a ser misturada com a areia e o cimento.

Fiz a amassadura sem empregar muita cal (nunca gostei de a usar em proporções muito elevadas), mas a massa pareceu-me um pouco diferente do habitual, talvez um pouco menos viscosa, o que me fez ficar com alguma dúvidas, que não foram suficientes para depreender que a cal ainda estava em estado vivo e executei o trabalho sem que tivesse notado algo de anormal no mesmo.

No dia seguinte o patrão veio falar comigo e o que me disse parecia a repetição de um “filme” antigo que já se tinha passado comigo.

- Zé, a massa caiu toda para o chão!!!...

Naquele momento lembrei-me do episódio da massa que aplicara num teto que também se soltara (história contada em Reboco de Paredes e Tetos), no entanto adivinhei logo o que passara desta vez… a cal fora misturada na massa em estado virgem e aplicada de imediato, o que originara o seu desprendimento da parede!

A culpa era toda minha e senti-me bastante mal com isso, ou envergonhado para ser mais correto. Fui corrigir o trabalho, que teve de ser feito na totalidade porque, mesmo existindo algumas partes que não se tinham soltado, optei por retirar essa massa e fazer tudo de novo. Felizmente tratava-se de áreas reduzidas e o valor do material que se perdera era insignificante, sendo a mão de obra de pouco mais de uma hora. De qualquer modo serviu-me de lição para que daí para a frente tivesse mais cuidado com os produtos a utilizar nos diversos trabalhos, para evitar arrelias de futuro.

Mais tarde soube que não foi só a mim que aconteceu um desses percalços. Um colega contou-me que, nessa mesma altura quando se deu o aparecimento da cal em pó ensacada, andava a trabalhar para um empreiteiro e o mesmo erro foi cometido por ele e por outros trabalhadores, todos bastante experientes, mas que foram traídos pela nova forma em que a cal se apresentava.

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2 comentários:

  1. Amigo José Alexandre , sempre muito interessante sua publicação, imagina o amigo que eu mesma faço a 'caiação' em minha casa?
    Nós costumamos usar uma vez ao ano, caiar as paredes de nosso quintal e do canil, isso se deve ao fato de cal ajudar a controlar parasitas que poderiam se aproveitar de nossos cães , principalmente o carrapato ...sabia dessa?
    Eu e as irmãs colocamos nossa proteção nos cabelos e pegamos pesado ...ahah, dois dias e pronto, tudo caiado!
    :D

    beijinho da Tin, boa semana!!

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    1. Olá amiga Cintia
      É verdade, a cal também tem a vantagem de ser desinfetante e, portanto, indicada para caiar canis e instalações agro-pecuárias. Obrigado pela achega.

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